segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Até quando vou fingir que o problema não é comigo...


Já se passava da uma da manhã, horário de verão, dessa segunda-feira de outubro. Três menores aparentando terem 12 anos de idade andavam de bermuda e chinelo de dedo pela fria Oswaldo Cruz olhando as vitrines das lojas.

Eu passava de carro e notei a cena. Eles não se pareciam um com o outro, não eram irmãos com certeza. Teriam casa, família, estariam alimentados pensei comigo?! – Mas o fato é que não tive coragem de perguntar isso a eles. Assim como não dou dinheiro ao ser interpelado nas praças ou ruas de Apuka, fiz de conta que não vi aquilo.

Mais adiante, na Avenida Curitiba, pouco mais abaixo, vi algumas pessoas, entre eles também menores que dormiam sob a marquise de uma loja. Claro, covardemente e sem problemas, fingi também que não era comigo. Afinal de contas, não sairia do conforto do meu carro, no frio pra falar com uns fedidos de rua.

- O Conselho Tutelar e o Promotor que se virem com isso, eu pago meus impostos!

Duas da manhã, cheguei em casa. Com muito custo, desci do carro, apanhei as chaves no bolso e abri os três cadeados do meu portão. Abri o portão e estacionei. No outro bolso estavam as chaves tetra da porta de casa. Claro que acionei o alarme do carro e desarmei os alarmes de casa pra entrar na minha fortaleza.

Observei, meus filhos dormiam tranquilamente, tomei um banho e também me deitei. Eram duas e meia da manhã.

Lembro-me que acordei assustado às quatro e dez exatamente, havia tido um pesadelo e nele, meus filhos estavam lá na rua vasculhando o lixo de um mercado. Apavorado não podia fazer nada e via que tinham achado um caderno velho com umas folhas em branco. Nele escreviam com um pedaço de carvão - “ O Tio da casa bonita e segura, a gente não quer roubar nada, a gente só que saber se o senhor pode arrumar um trabalho para nosso pai, passou o Dia das Crianças e ele não pôde dar nada pra gente...” – Lembrei disso e tentei dormir de novo.

Seis e meia me ligaram da redação contando de três meninos que apanharam de um empresário que os flagrou cheirando cola. Eles falavam alto e acordaram ele. Com um pedaço de pau ele feriu os moleques que apanharam rindo. Segundo o Samu, eles estavam dopados – Não sentem frio nem fome assim, disse o médico socorrista.

Um deles entrou em coma e morreu no hospital. Os outros dois feridos voltaram para as ruas, fugiram do Conselho após o atendimento.

Oito da manhã, próximo do meu trabalho, encontrei um amigão meu. Estava meio nervoso. Disse-me que teve uns problemas na madrugada e não tinha acordado bem.

Onze horas ele me ligou pedindo para eu abafar um caso de agressão a menores que estava sendo incutido a ele, as câmeras de vigilância da cidade o identificaram e tinha mandado os advogados à delegacia se explicarem. Disse até que teve que fazer um corte no próprio braço para fingir que agiu para se defender, se a polícia não cair na história dos advogados dele, enfatizou ironicamente e desligou em seguida sem ouvir minha resposta.

Ciente do caso eu resolvi mudar de atitude, mas não deixei de fazer de conta que não era comigo, só mudei de lado. Ignorei o que disse e que até então o tinha como amigo. Publiquei o caso que foi usado no processo e passei a visitar com minha família os moradores de rua de Apuka.

Disso tudo, conclusões - enquanto viver entre grades e alarmes, o preso sou eu. Enquanto nas ruas, crianças e adolescentes, o problema é mais meu do que imagino!


Por: BaratA – Colado no seu calo!

Um comentário:

Anônimo disse...

Parabens, pela história, a verdade doi, o pior que o imposto nem sempre chega onde deve chegar, mas a gente paga e não fiscaliza. Fazer o que!!!!!!!!!!!! O importante e falar EU NÃO DEVO. É facil jogar a batata quente para os outros, ou sentar em cima do proprio rabo e ficar olhando os dos outros